A grande batalha do “o que é design?” foi vencida… pelo cansaço.
Falando sério, poderíamos dizer que as muitas disputas acerca da definição do design, que foram acirradas entre fins de 1990s e começo dos 2000, tiveram um desfecho anti-climático, sem nenhuma das propostas se estabelecendo de forma clara. Mais do que uma conclusão, parece ter surgido um consenso de que a definição não era tão importante assim.
Será que os designers desistiram do seu sonho de ter uma profissão reconhecida? Será que a própria área do design desistiu do sonho de se definir? Que sonho, exatamente, era esse?
É claro que o sonho não era ser definido, mas sim ser importante. Afinal, a gente sabe o que a gente quer, então se as pessoas quisessem design elas saberiam o que é design. E por isso, uma definição ajudaria a fazer os outros reconhecerem nosso trabalho.
Rapaaaaz…
Os erros desse raciocínio são tantos que é difícil saber por onde começar, mas a conclusão final não deveria ser desistir do sonho, nem porque ele seja impossível, nem porque o valor dele seja enganoso. Talvez seja ainda possível voltar ao ponto de partida e, como nas fábulas, re-entender a nossa essência através dessa jornada ao desconhecido.
E a primeira coisa que precisamos re-entender é justamente esse cansaço. Já não temos mais a sensação de que vale à pena lutar pela definição. Porque? Percebemos que uma definição em palavras não tem muito impacto no trabalho que fazemos, no nosso projetar — e a discussão ficou parecendo vazia. Descobrimos que definir design era fazer teoria sem prática.
Nada é mais importante para os designers do que a prática. De fato, uma certa preocupação com o palpável é um traço definidor de todo designer, mas aí vemos que se trata de uma compreensão bem complexa do que é a prática. É uma preocupação com a materialidade que não se esgota num materialismo. (Mas note que também não nega o materialismo — podemos ser designers materialistas também — materialiiiistaaaa-ah!)
Essa prática é justamente o sonho do design de ser importante. É a sensação de que passamos a vida num mundo material, feito de coisas físicas, e que essas coisas todas são projetadas, são criadas com carinho e habilidade por designers como nós, e que portanto a realidade mais direta e imediata é a realidade do design. E se o design se confunde com a realidade da vida contemporânea, como é possível que o seu cliente quer “só um desenhozinho”?
Dito de outro modo, nós vivemos num mundo em que cada artefato é uma confluência de técnicas e discursos, formando um jogo, um pouco maravilhoso e um pouco cruel, de conforto e preços inacessíveis, de experiências e sensações prazerosas e contraditórias. Todos nós vivemos nesse mundo, mas só os designers parecem vê-lo.
E agora está na moda dizer que o design é mais do que material. A intenção por trás dessa fala é dizer que também se projeta o processo, também se desenha a experiência, que também se constrói o sentido. E tudo isso é verdade. Mas se o design for tudo isso e deixar de ser matéria pra tanto ele passa a ser só esse espírito descorporificado — é um retorno da ideia de pureza sem pecado da moralidade judaico-cristã.
O design é um mundo materialista e permeado de sentido. Um mundo em que o sentido é a matéria. Um processo em que a construção de mundo que é a vida de cada pessoa se dá através da materialidade. Tanto no sentido de que os dispositivos materiais servem para construir sonhos, quanto no sentido de que os sonhos adquirem corpo.
E isso se dá em tantos níveis, todos ao mesmo tempo. Um desses níveis é que a experimentação manual física com o papel e a tinta e as colas e os modelos é também uma construção de sentido. E outro é que essa experiência gera discussão, gera polifonia, gera até mesmo dissonância, mas que assim a gente constrói esse mundo-sentido-material juntos. Tudo isso é legal. Mas além disso tem também aquele design que a gente faz com ideologia e com toolkits e com lero-lero furado de marketing. Tudo isso ao mesmo tempo.
Enfim. Esse é o design que eu acredito. E ele certamente não é Funcionalista (/Racional /Iluminsta /Moderno /qualquer nome para o lado “espiritual” da vida). Mas ele também não é só Experimentalista (/Emocional /Romântico /Anti-moderno /qualquer nome para o lado “pecaminoso” da vida). Não sei ainda qual nome dar pra isso.
Mas fica aí o convite pra gente descobrir.


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